Todos praticam o
perdão no dia a dia. As relações humanas construídas com os valores da
dignidade, respeito e amor incluem a prática do perdão. A vida sem o perdão é limitada e doente. O
perdão cria uma dinâmica de vida movida por relações humanas que acontecem
entre semelhantes imperfeitos. A violência, as injustiças, desigualdades e boa
parte do sofrimento humano têm origem na imperfeição, nos comportamentos do ser
humano que dependem de superação.
Para os cristãos o
perdão é fundamental. Ele integra a vida de fé, a relação de comunhão com Deus
e com os outros. Quando conversamos sobre o perdão com as pessoas que partilham
do nosso quotidiano, percebemos as diversas facetas desta prática e do seu
valor. Alguns dizem que diariamente necessitam
de ser perdoados. Outros respondem que já estão no limite e não conseguem mais
perdoar. E há aquelas pessoas que já duvidam do perdão, devido o seu desgaste,
por ter tornado uma pratica corriqueira, ao ponto de não gerar arrependimento,
ou mudanças no comportamento e na vida das pessoas.
Os cristãos incorporaram,
com a prática comunitária da fé, o entendimento de que ainda vivem numa
condição de imperfeitos e, na linguagem da fé, na condição de pecadores. Creem
que dependem do perdão de Deus, da sua ação salvadora, pois não conseguem
salvar a si mesmos. Conforme a Bíblia na carta aos Romanos 7.15: Fazem o mal que não querem, e deixam de
fazer o bem que tanto almejam. Estão certos de que o perdão de Deus resulta
em liberdade para viver e em capacitação para servir e fazer o bem que advogam.
É assim que o perdão adquire esse valor especial. Ele passa a ser a porta de
entrada para uma dinâmica de vida livre de culpa, de condenação e de
indiferença. Torna-se a porta que se abre para o caminho da ação solidária,
transformadora, acolhedora, onde os valores da dignidade, da justiça e da paz
assumem o lugar de sinais, de luzes que apontam para horizontes novos, onde a
vida se renova e torna-se eterna.
As pessoas que integram
as comunidades de fé em Jesus Cristo aprendem que a sua própria prática do
perdão e o perdão de Deus não os retiram da realidade, da condição humana
frágil e imperfeita. Ao contrário, os comprometem com a missão de incidir na
realidade, interagindo com as iniciativas comunitárias e civis que transformam
vidas, que resgatam condições justas para viver. Além disso, descobrem que a liberdade, que
surge da comunhão com o Deus da reconciliação e perdão facilita a vida, dá
sentido, abre horizontes, vence medos e cura angústias. A vida fica mais bela. Aguça o discernimento
e dificulta o assédio do mal.
Sabemos, no entanto,
que nem todos e todas que si dizem cristãos têm medo da separação vivencial de
Deus. Não sentem a necessidade de salvação. Não se sentem perdidas. É comum nas
igrejas modernas, por exemplo, a omissão da confissão de pecados. Toda a
revelação na Bíblia da imperfeição humana e da dependência da ação salvadora de
Deus é substituída por uma interpretação que destaca a busca humana das dádivas
e benefícios de Deus. A ação protagonista de Deus é transferida para a dimensão
humana. Certamente essa mudança resultou da paulatina sistematização das
reações das novas gerações contra o uso da situação de dependência do ser
humano de Deus como meio para oprimir, manipular, julgar, excluir e
criminalizar.
Uma vez a
transferência da ação salvadora para o ser humano, sem a participação
reconciliadora de Deus. Outra vez a reação contra a violenta apropriação da
ação de Deus para justificar atrocidades. São dois extremos que dificultam, nos
dias de hoje, a leitura do lugar do perdão na vida de fé e o seu valor para a
liberdade do ser humano. Este é um desafio enorme depositado no colo das
comunidades cristãs. O Espírito Santo sopra o clamor para que o valor do perdão
seja resgatado. A sua prática liberta e cria caminhos de paz.
Jesus incluiu o perdão
na sua oração, denominada por nós de Pai Nosso. O pedido de perdão – “perdoe as nossas dívidas, assim como nós
perdoamos aos nossos devedores” - foi incluído entre as poucas petições. A
oração que Jesus ensinou continua despertando os cristãos para a prática do
perdão. E associa a sua prática no quotidiano, com o recebimento do perdão por
parte de Deus, a dádiva da liberdade.
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